segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Efeitos colaterais




Não vale a pena ser pessimista. O pessimismo é um estado de espírito paralisante. Modulado pelo realismo, é uma ferramenta do processo de conhecimento crítico. Somente isso. Não combina com a vida, que é sempre política: nos obriga a tomar partido.
Quando Romain Rolland falou em “pessimismo da inteligência e otimismo da vontade”, ele não estava olhando com amargura para o futuro. Gramsci pegou a ideia e a converteu em grito de guerra.
Fatos e propostas novas surgem o tempo todo, dia após dia. Nem sempre vencem e nem sempre surgem no momento certo ou do melhor modo. Mas deixam marcas. Como as ciclovias na cidade de São Paulo. Ou a “nova política” de Marina Silva. Ou a Carta aos Brasileiros de Lula, em 2002.
A história é feita de sangue, suor e lágrimas. É muito mais luta, disputa e conflito do que solidariedade e cooperação. Não há consensos fáceis, talvez não haja sequer consenso. Não há também entrega sem dor à mudança. Mudar exige muito, ainda que fascine. Os humanos são assim, sempre foram, continuarão sendo. São teimosos, temerosos, resistem ao diferente e ao desconhecido. Mas ao final sempre avançam.
É por isso que a história também é feita de testes, experimentos e aberturas de fronteiras. De provocações e utopias. De contestações e portas sendo derrubadas. De manifestações erráticas, explosivas, sem líderes e agenda articulada. De oportunidades perdidas. Avanços e retrocessos.
Se olharmos para o processo eleitoral em curso, podemos constatar que algumas coisas estão destinadas a sobreviver a ele e a produzir efeito no futuro. Podem ser entendidas como efeitos colaterais do embate político-partidário pouco produtivo a que estamos assistindo. Penso em 10 delas.
1.    José Roberto Arruda prometeu abandonar a vida pública.
2.   Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobrás, devolverá US$ 23 milhões de propinas que mantinha em contas bancárias na Suíça.
3.   O sertão virou mar e o mar virou sertão.
4.   O Minhocão entrou definitivamente na agenda política de São Paulo.
5.    O Horário Eleitoral Gratuito confirmou sua condição de Febeapá, festival de besteiras que assolam o país. Consolidou a posição de quintessência do deboche nacional.
6.   Graças aos vai-e-vem de Marina Silva e à ousadia de seu programa de governo, a questão gay saiu do armário. O casamento homoafetivo e a criminalização da homofobia estão hoje no centro da agenda brasileira.
7.    O financiamento da política pelas grandes empresas atingiu nível tão escandaloso que dificilmente deixará de ser extinto.
8.   O PSDB perdeu a aura de partido de oposição que um dia achou que seria e nunca conseguiu ser.
9.   Depois de descartar os últimos anéis que o distinguiam no plano ético-político, o PT deixou de poder se apresentar como partido de esquerda. Reduziu-se à farinha do mesmo saco que ele tanto abominava nos saudosos anos 1980.
10.    Esquerda e direita provaram ser, no Brasil, conceitos relativos e relacionais: se você está deste lado eu estou do outro. Tornaram-se sinônimos de governo e oposição, não de projetos consistentes de sociedade, de valores ou ideologias. A esquerda, em particular, precisa se recriar.
São coisas que podem nos desagradar ou nos alegrar. Fatos da vida. Servem sobretudo para nos ajudar a pensar. Contribuem para que verifiquemos o quanto avançamos, busquemos respostas novas e descubramos os melhores caminhos para o futuro.

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